quinta-feira, 20 de novembro de 2014

CAROLINA MARIA DE JESUS

LITERATURA E PROFECIA NA FAVELA


Maria Clara Lucchetti Bingemer

Carolina Maria de Jesus nasceu a 14 de Março de 1914 em Sacramento, estado de Minas Gerais, cidade onde viveu sua infância e adolescência. Foi filha de negros que, provavelmente, migraram do Desemboque para Sacramento quando da mudança da economia da extração de ouro para as atividades agro-pecuárias.
Carolina não se casou e foi mãe de três filhos: João José de Jesus, José Carlos de Jesus e Vera Eunice de Jesus Lima. Migrou para São Paulo em 1947, em busca de vida melhor, indo morar na extinta favela do Canindé, na zona norte da cidade. Aí trabalhou como doméstica, não se adaptando, contudo, a esse tipo de trabalho. Passou a trabalhar como catadora de papel, trabalho que realizou até sua morte. Faleceu em 13 de Fevereiro de 1977, com 62 anos de idade e foi sepultada no Cemitério da Vila Cipó, cerca de 40 km do centro de São Paulo.
Quem lê a escrita sensível e poética de Carolina não imagina como sua escolaridade formal foi parca e lutada. Foi matriculada em 1923, no Colégio Allan Kardec, primeiro Colégio Espírita do Brasil. Foi mantida no colégio graças à generosidade de uma benfeitora, a senhora Maria Leite Monteiro de Barros, para quem a mãe de Carolina trabalhava como lavadeira. No Colégio Allan Kardec Carolina estudou pouco mais de dois anos. Toda sua educação formal na leitura e escrita advém deste pouco tempo de estudos.
Até aqui, temos uma história que poderia ser a de qualquer outra mulher brasileira pobre: negra, semi-alfabetizada, favelada, como tantas que existem pelo Brasil afora, não fosse por um detalhe – a paixão de Carolina Maria de Jesus pela leitura e pela escrita. Isso fez toda a diferença em sua vida.  Carolina dividia seu tempo entre catar papel, cuidar dos filhos e escrever. E sua escrita acabou sendo documento importante e parte fundamental da literatura de denúncia feita pela mulher, objeto de estudo e pesquisa por todos aqueles que desejam conhecer o verdadeiro Brasil que se esconde através das fachadas das elites.
Além de Quarto de despejo, Carolina também publicou Casa de alvenaria (1961), Provérbios e Pedaços da fome (1963) e Diário de Bitita (publicação póstuma, realizada em 1982, pela editora francesa A. M. Métailié). Há indícios, na prosa da escritora, de que ela teria tido acesso a obras de grandes escritores brasileiros, provavelmente nas casas em que trabalhou, o que explicaria as menções em suas obras a poetas como Casimiro de Abreu e Castro Alves. Em seus livros, Carolina alterna incorreções ortográficas, sintáticas e de pontuação – reflexos da linguagem oral e da alfabetização deficiente – com o emprego correto de termos específicos da linguagem escrita culta.
      Outro traço particular da escrita de Carolina Maria de Jesus é sua consciência política e social. Passagens de seus livros mostram que a escritora estava sempre informada do que acontecia não só em São Paulo, mas também em outros Estados, provavelmente por meio de notícias lidas em jornais que via nas bancas.
 A obra mais conhecida, com tiragem inicial de dez mil exemplares esgotados na primeira semana, e traduzida em 14 idiomas nos últimos 35 anos é Quarto de Despejo. Lançado pela Livraria Francisco Alves em agosto de 1960 e editado oito vezes no mesmo ano, Quarto de despejo teve mais de 70 mil exemplares vendidos na época, quando para se considerar uma publicação de sucesso, era preciso alcançar a margem de, aproximadamente, quatro mil exemplares. Nos cinco anos seguintes, Quarto de despejo alcançou mais de 40 países, como Dinamarca, Holanda, Argentina, França, Alemanha, Suécia, Itália, Tchecoslováquia, Romênia, Inglaterra, Estados Unidos, Rússia, Japão, Polônia, Hungria e Cuba.
Carolina não era alienada.  Tinha consciência de sua condição e da injustiça que lhe fazia levar aquela vida.  Em seu diário escrevia: “Hoje em dia quem nasce e suporta a vida até a morte deve ser considerado herói.” Desanimo, desespero, tentação de suicídio, tudo isso rondou Carolina durante sua vida.  Mas também se pode ver em seu livro que Deus não a abandona e continua a dar-lhe coragem para a luta de cada dia.  E mesmo a deslumbra com sonhos e visões encantadas que lhe aquecem a alma poética.
Por isso se podem ver em seu diário trechos como este, do dia 2 de setembro: 
"...Eu durmi. E tive um sonho maravilhoso. Sonhei que eu era um anjo. Meu vistido era amplo. Mangas longas côr de rosa. Eu ia da terra para o céu. E pegava as estrelas na mão para contemplá-las. Conversar com as estrelas. Elas organisaram um espetaculo para homenagear-me. Dançavam ao meu redor e formavam um risco luminoso.
Quando despertei pensei: eu sou tão pobre. Não posso ir num espetaculo, por isso Deus envia-me estes sonhos deslumbrantes para minh'alma dolorida. Ao Deus que me proteje, envio os meus agradecimentos."
Aguerrida, Carolina em meio a seu indizível sofrimento, mantinha a esperança.  Sonhava com o dia em que seu país, seu povo, iam melhorar.E produzia escrita profética.  Prova disso é o que escreve em seu diário: “O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora. Quem passa fome aprende a pensar no proximo, e nas crianças.”
 Ela morreu três anos antes da fundação do PT e mais de vinte anos antes de ver um operário retirante, que passou fome na infância, ganhar pelo voto a Presidência da República e ser reeleito para um segundo mandato.
Que diria hoje Carolina, no final do segundo mandato do governo Lula?  O que escreveria em seu diário?

* Maria Clara Lucchetti Bingemer, teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, e Diretora Geral de Conteúdo do Amai-vos. É também autora de "A Argila e o espírito - ensaios sobre ética, mística e poética" (Ed. Garamond), entre outros livros.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

A PAZ Roupa Nova







Deve haver um lugar dentro do seu coração
Onde a paz brilhe mais que uma lembrança
Sem a luz que ela traz já nem se consegue mais
Encontrar o caminho da esperança
Sinta, chega o tempo de enxugar o pranto dos homens
Se fazendo irmão e estendendo a mão

Só o amor muda o que já se fez
E a força da paz junta todos outra vez
Venha, já é hora de acender a chama da vida
E fazer a terra inteira feliz



Se você for capaz de soltar a sua voz
Pelo ar, como prece de criança
Deve então começar outros vão te acompanhar
E cantar com harmonia e esperança
Deixe que esse canto lave o pranto do mundo
Pra trazer perdão e dividir o pão
Só o amor muda o que já se fez
E a força da paz junta todos outra vez
Venha, já é hora de acender a chama da vida
E fazer a terra inteira feliz
Quanta dor e sofrimento em volta a gente ainda tem
Pra manter a fé e o sonho dos que ainda vêm
A lição pro futuro vem da alma e do coração
Pra buscar a paz, não olhar pra trás, com amor
Se você começar outros vão te acompanhar
E cantar com harmonia e esperança
Deixe, que esse canto lave o pranto do mundo
Pra trazer perdão e dividir o pão
Só o amor muda o que já se fez
E a força da paz junta todos outra vez
Venha, já é hora de acender a chama da vida
E fazer a terra inteira feliz
Só o amor muda o que já se fez
E a força da paz junta todos outra vez
Venha, já é hora de acender a chama da vida
E fazer a terra inteira feliz
Só o amor muda o que já se fez
E a força da paz junta todos outra vez
Venha, já é hora de acender a chama da vida
E fazer a terra inteira feliz
Venha, já é hora de acender a chama da vida
E fazer a terra inteira feliz,Inteira feliz








Observe o efeito de sentido que algumas expressões empregadas  na letra da música, assumem para transmitir determinadas ideias.

1)Em “Se fazendo irmão e estendendo a mão”, a expressão destacada sugere que
A(    ) os irmãos devem se ajudar.
B(    ) devemos agir como irmãos e ajudar uns aos outros.
C(    ) os irmãos sempre estendem a mão uns para os outros.
D(    )estendemos a mão somente aos irmãos.

2)No verso da 3ª estrofe, “Venha, já é hora de acender a chama da vida”, a expressão destacada dá ideia de que
A(    ) a vida deve ser acessa por alguém.
B(    ) é necessário chamar alguém para acender a vida.
C(    ) o mundo precisa de pessoas que coloquem fogo na vida.
D(    ) para a terra ser feliz é necessário que tenhamos boas ações na vida.
3)Observe a imagem e pense no sentido que a expressão "...em nossas mãos", transmite ao leitor.




terça-feira, 29 de outubro de 2013

A Justiça


Quando criança eu tinha a mania de me sentir sempre injustiçado. Por um ou outro motivo, não me tinham feito justiça, sem perceber que, para mim, a injustiça era sempre qualquer restrição feita aos meus desejos, fantasias e vontades.
E invariavelmente arrebentava em lágrimas de protesto.
Um dia papai me chamou e disse:
- Meu filho, vamos combinar uma coisa. Você sabe que papai não gosta de ver você triste, não é? Então nós vamos fazer o seguinte: cada vez que você chorar, escreva num papel a causa. Coloque o papel no vaso azul, ali, sobre a escrivaninha. Deixe passar alguns dias e leia-o. Se achar que o assunto ainda o está aborrecendo, venha a mim, conte-me o caso e eu lhe prometo que corrigirei a injustiça que tiverem feito contra você. Combinado?
Estava combinado. Nos primeiros dias eu enchi o vaso azul de anotações. Passadas no preto e branco, minhas queixas me pareciam perfeitamente justificadas.
Passaram-se os dias e meu pai voltou a falar comigo.
- Você já pode começar a reexaminar os seus papéis. Depois venha falar comigo.
Comecei. Mas, estranhamente, constatei que minhas queixas eram banais e que, na realidade, não havia naquilo nada que pudesse motivar aborrecimento.
Abreviei o espaço dos dias e, depois, passei a examinar os papéis horas depois dos acontecimentos.
Verifiquei que não tinha nenhuma injustiça a exigir a reclamação de papai. E parei de chorar várias vezes ao dia, como estava acostumado a fazer.
Hoje compreendo que tudo foi uma brincadeira de papai. Todavia, com grande habilidade ele me levou a refletir antes de agir. E desenvolveu em mim a compreensão a respeito do que é justiça e injustiça em face do nosso egocentrismo, exigência de privilégios e pretensões descabidas.
Com isso meu espírito de tolerância ganhou uma amplitude que me tem beneficiado ao longo de toda a vida.
Da obra "E, Para o Resto da Vida...", Wallace Leal V. Rodrigues, ed. O Clarim.